Carta aberta aos meus sentimentos

O Jorge Silva Melo morreu.

Morreu com vontade de ter dançado muito mais na vida, pela vida fora. Contou-o ao Bernardo Mendonça no podcast Beleza das Pequenas Coisas, que só por si já é um nome sugestivo.

Jorge Silva Melo morreu com vontade de ter amado mais. Contou-o, pareceu-me, sem pena na voz. Ou talvez seja a minha interpretação a recusar tamanho arrependimento num septuagenário. Que ninguém merece ver-se no fim da vida e sentir tê-la desperdiçado nos assuntos do coração.

Jorge Silva Melo morreu e, antes de morrer, gostava de ter dado mais vida aos seus sentimentos. Que devia ter passado mais tempo na casa da vizinha, uma vizinha metafórica para dizer que a sua vida foi sempre de trabalho e que devia ter sido, em parte, vida.

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Expresso 2:59

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A propósito da nova rubrica do Expresso Online, 2:59:

A ideia é excelente e acrescenta muito ao site do Expresso. Está um passo à frente dos Explicadores do Observador e parece que o público está a gostar. Cheira-me que 80% do sucesso está no facto de serem vídeos e nos efeitos sonoros e gráficos bonitinhos. O factor novidade também ajuda.

O fundo escuro dos vídeos torna a coisa um bocado sombria. As explicações podiam ser mais naturais, mas a naturalidade perde-se na tentativa de coordenar os gestos com os grafismos que vão ser colocados na edição. O que não acontece, por exemplo, no Vox.

O Vox, do Ezra Klein, é um dos projectos mais interessantes que surgiram no jornalismo recente. Um dos trabalhos mais giros que o Vox fez foi uma longa entrevista com o presidente dos Estados Unidos (com duas partes e uma série de vídeos). Os grafismos são surpreendentes e a forma como estão inseridos na edição, a coincidir com a naturalidade dos movimentos de Barack Obama, acrescenta sofisticação ao vídeo.

Na onda dos explicadores e do jornalismo de dados, o Vox também merece atenção.

O Expresso Online tem feito um esforço notório para usar ferramentas novas e modernas. A utilização das redes sociais (apesar de ser um pouco tosca, ou sou eu que não atino com o Snapchat) é meritória. O site é actualizado ao minuto e dá gosto ler alguns títulos de reportagens. Ainda há muito a fazer, mas o 2:59 parece ser já um sucesso. Que venham mais projectos como este (que, infelizmente, não disponibiliza os vídeos no YouTube).

Fica o link.

Suspenda-se a democracia

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Christine Lagarde, directora do FMI (Telegraph)

 

A manchete do Expresso que acabo de ler avisa que o FMI suspendeu a ajuda à Grécia até que um novo Governo tome posse. As eleições antecipadas acontecem no fim de Janeiro e foram precipitadas pela terceira tentativa fracassada para a escolha do candidato presidencial.

Dos 180 votos necessários, Stavros Dimas recolheu 168 nesta última volta. Os deputados estavam conscientes das consequências imediatas que uma não-escolha teria. Não deixa de ser admirável que o país europeu mais castigado pela intervenção externa tenha resistido às pressões ameaçadoras para evitar a crise política.

E não deixa de ser admirável que o FMI, essa entidade que, como se sabe, presta ajuda financeira (keyword: ajuda) à Grécia decida acrescentar à crise política nova instabilidade, novas dificuldades.

Suspende-se a ajuda financeira se não se suspende a democracia?