30 antes dos 30: 2001: A Space Odyssey

2001: A Space Odyssey. Stanley Kubrick (1968)

This is Major Tom to Ground Control
I’m stepping through the door
And I’m floating in a most peculiar way
And the stars look very different today

Roger Ebert disse que 2001: A Space Odyssey lhe provocou arrepios e que nenhum crítico de cinema deveria alguma vez proferir afirmação tão pirosa. A obra prima de Stanley Kubrick prestou-se a inúmeras leituras e, ainda hoje, o seu significado é uma incógnita para os que não deixam de fazer perguntas. Entre as poucas certezas, uma resistiu a estes 51 anos: foi aqui que se fundou a era moderna da ficção científica no cinema. Foi aqui que o espectador passou a sonhar com o que está para lá do visível e com o que é possível nessa grande odisseia das viagens espaciais. Conseguir fazê-lo no ano de 1968 é mais do que suficiente para provocar arrepios. Continuar a ler

30 antes dos 30: Bram Stoker’s Dracula

Gary Oldman em Bram Stoker’s Dracula, de Francis Ford Coppola

Em 1992, num momento de impasse pessoal na indústria, Francis Ford Coppola arrisca na repetição de Dracula. “Mais um versão?”, poderiam ter-lhe perguntado. Socorrendo-se de um elenco de luxo e do cuidado extremo em cada pormenor, Coppola entrega não uma versão mas a sua própria interpretação do vampiro. Por isso, dá-lhe o nome do criador e transforma Bram Stoker’s Dracula numa homenagem simultânea à história e ao cinema. Afinal, não é assim que se fazem os clássicos?


A resposta afirmativa à pergunta está tão simplesmente nas escolhas e no método de Francis Ford Coppola. A preparação do filme começa com um storyboard animado distribuído por toda a equipa para que a sua visão transitasse, com precisão, da sua mente para a realidade. Impregnado dessa visão, o filme ganha forma com o que foi um dos segredos do seu sucesso – o guarda-roupa. Continuar a ler

Darker

Leonard Cohen

Leonard Cohen

Abri os olhos para desligar a música que toca como despertador.

Li a notificação. Fechei os olhos e pensei, “não”.

“Morreu Leonard Cohen”.

“Não”.

Ainda há poucas semanas, a New Yorker dizia que Leonard Cohen estava pronto para morrer. “I’ve got some work to do. Take care of business. I am ready to die. I hope it’s not too uncomfortable. That’s about it for me.”

Palavras do próprio, a propósito do lançamento do último disco (You Want it Darker) e em jeito de reflexão a olhar para trás, na vida. A sua Marianne tinha ido há alguns meses e escreveu-lhe:

“Well Marianne, it’s come to this time when we are really so old and our bodies are falling apart and I think I will follow you very soon. Know that I am so close behind you that if you stretch out your hand, I think you can reach mine. And you know that I’ve always loved you for your beauty and your wisdom, but I don’t need to say anything more about that because you know all about that. But now, I just want to wish you a very good journey. Goodbye old friend. Endless love, see you down the road.”

Conhecemos o disco e ouvimos a mesma despedida. Na faixa que dá título ao álbum, Cohen canta, naquela rouquidão arrasta: “Hineni, hineni, I’m ready, my Lord“. Hineni, no hebraico, “here I am”, em inglês.

Naquela entrevista de Outubro, à New Yorker, Cohen relatava que estava a organizar a vida. Tratar de assuntos, pôr tudo em ordem. Bastou-lhe um mês. Viu Bob Dylan ganhar o Nobel da Literatura, que muitos lhe haviam reservado. Viu ser lançado o seu último disco, em vida (deixou muito material para os próximos tempos). Viu o povo americano eleger Donald Trump como presidente. Despedidas feitas, vida organizada – “I’m ready, my Lord”.

Tudo em Cohen arrepia e a despedida não podia ser diferente.

Como também não foi diferente a despedida de David Bowie, ele que nos deu todos os sinais do que estava para vir.

Quando, em Dezembro, lançou “Lazarus“, não ouvimos. Estava lá escrito.

“Look up here, I’m in heaven
I’ve got scars that can’t be seen
(…) Oh I’ll be free
Just like that bluebird”

David Bowie preparou a própria morte, com canções que arrepiam a alma. Despediu-se quando o trabalho estava pronto. Chegou Janeiro e partiu para esse sítio de onde veio, que ninguém sabe bem qual é.

Aprendemos a lição e começámos a despedir-nos de Cohen há um mês, mas o tempo nunca chega e há tanta música por dar, tanta poesia por escrever, tanta gente por inspirar.

Bowie e Cohen não foram arrancados à vida. Como se conhecessem a Morte das intermitências de Saramago, fizeram um pacto com ela, para que os viesse buscar quando chegasse o momento.

Será só aos grandes que esse privilégio está reservado? Os maiores de todos os grandes podem fazer acordos com o divino, havendo, para decidir da data e hora finais, local também?

50 ways to leave your lover

Esta música apareceu-me em 2013, no editorial de despedida do Pedro Santos Guerreiro, quando deixou o Jornal de Negócios. Não saiu, deixou. Como quem deixa o seu amor.

Desde então, quando tenho deixado os meus amores, ela volta a aparecer-me. Na cabeça, na rádio, numa sugestão do YouTube.

Ontem, apareceu-me em selecção do Samuel Úria, numa edição antiga da Cantina (programa muito recomendável da Antena 3) , onde também se passou Prince depois de Bowie (e George Harrison, porque é sempre preciso haver George Harrison).

She said it grieves me so to see you in such pain
I wish there was something I could do to make you smile again
I said I appreciate that and would you please explain
About the fifty ways